COMPROMETIMENTO
“Um resultado que gera resultados”
por Senir Fernandez
Imagine estas situações fictícias em que a semelhança com a realidade não é mera coincidência:
a empresa está perdendo talentos...
ou o “turnover da área de tecnologia está muito acima do normal...
ou a quantidade de reclamações de clientes cresceu...
ou estamos perdendo a capacidade competitiva porque as áreas não se falam e não cooperam entre si...
ou aumentaram os erros e o índice de retrabalho...
ou os nossos resultados foram inferiores às metas estabelecidas e menores que no período anterior.
Para estes problemas, as soluções não fictícias em que a semelhança com a realidade não é mera coincidência, são:
faça uma pesquisa salarial e, se for o caso, coloque a remuneração total no terceiro quartil...
ou faça uma campanha de vendas...
ou temos que fazer uma mudança rápida no layout e nas instalações..
ou precisamos rever nosso plano de comunicação com os funcionários...
ou vamos dar um treinamento para os gerentes...
ou troca o gerente.
As conseqüências, ou os resultados da implantação destas soluções normalmente geram outros problemas: aumento de custos, inconsistência de práticas e de políticas e reprodução do mesmo problema em outras áreas, o que normalmente chamamos de “efeito dominó”.
Então como encontrar as soluções para reter talentos, manter ou melhorar a satisfação de clientes, ter maior cooperação entre as áreas, diminuir erros e retrabalhos, aumentar a produtividade? Se as variáveis que geraram os problemas não são de mercado, imagem ou de aspectos exclusivamente tecnológicos, a solução está no comprometimento dos profissionais.
Se a solução passa pelo grau de comprometimento, vamos refletir sobre como entendemos e o que compõe esse comprometimento.
Para alguns, comprometimento é ou não é, ou seja, as pessoas estão ou não estão comprometidas. É uma visão maniqueísta do comprometimento, que não possibilita o entendimento dos fatores que o geram, da gradação e das conseqüências desse comprometimento. E se eu não conseguir entender o que cria o comprometimento não terei condições de atuar sobre ele.
Para outros, comprometimento é o grau de vínculo emocional que existe nos relacionamentos. E, sem dúvida, no comprometimento as emoções estão comumente envolvidas significativamente. Mas é mais do que isso. Comprometimento é resultante de vários fatores. A discriminação desses fatores e as conseqüências conforme os graus de percepção positiva é que dão o conhecimento do grau de comprometimento .
Então vamos começar pelo fim, os impactos ou indicadores de comprometimento:
Os relacionamentos são estabelecidos para produzir alguma coisa.. Mesmo que seja a produção do prazer durante o relacionamento. Produz-se bens econômicos, bens sociais, tecnologias, imagem, conhecimentos, valores, prazer...
Produzir é o objetivo do estabelecimento de uma relação. A medida primeira que é indicadora de que as relações são eficazes é a produtividade. A finalidade da relação de produzir ocorre satisfatoriamente, conforme as expectativas.
Os fatores primariamente relacionados com a produtividade nas relações são o grau de prazer e de crescimento envolvidos. Significa dizer que colocar as pessoas no que, no como e com quem elas gostam de produzir já possibilita a previsão de bom grau de produtividade. Esta produtividade é alavancada pelo vislumbre ou pelo efetivo crescimento que as relações proporcionam. A coincidência entre o que se quer produzir (assim como o processo de produzir) e a situação, parceria ou o que é demandado é garantia de um bom nível de produtividade. Esse nível de produtividade pode ser incrementado pelo crescimento previsto ou ocorrido.
Surge imediatamente ao estabelecimento da relação, uma projeção de tempo de duração da relação. Quanto tempo durará ? Meia hora? Um dia? Até produzir uma vez o que era o propósito da relação? Até criar um padrão ou tornar-se habitual? Nas relações de emprego ou de trabalho contratado seria o mesmo que perguntar se o profissional permanecerá na empresa por algum tempo, se estará relacionado a um tempo predeterminado, ou ao desejo de realizar sua carreira na empresa num tempo indeterminado. A rotatividade de profissionais e o absenteísmo são medidas relacionadas à permanência na relação. Os fatores predominantes que causam impacto direto na decisão de ficar e manter-se na relação são dois:
a interdependência econômica que na relação de emprego está diretamente relacionada à remuneração e benefícios;
o prestígio social e a identidade do indivíduo com os valores e características do grupo social (empresa).
Exemplos claros destes comportamentos de permanência ou rompimento podem ser observados quando a remuneração é inferior a uma referência de mercado ou quando a imagem da empresa fica desvalorizada socialmente. Internamente, quando a área ou equipe perde prestígio, há uma dificuldade maior de manter os profissionais nela.
Também após a relação estabelecida dois fatores iniciam sua construção, a confiança e o pertencimento. Podemos chamá-los de processos de valorização da relação. A confiança pode ser entendida como o grau de previsibilidade de comportamento. Se eu conheço ou combino previamente e cumpro, gero confiança. O processo de construção da confiança mútua está diretamente relacionado ao grau de conhecimento e previsibilidade que as partes possuem. Nas empresas o processo de comunicação e a prática consistente de políticas explícitas e convincentes geram o grau de confiança dos empregados. O pertencimento se dá pelo grau de participação, seja pela informação que transmite o sentimento de inclusão, passando pelo envolvimento nos processos, no fazer coletivo, e finalmente, em alto grau, pelo poder e competência de decisão. Estes dois fatores têm impacto direto nas atitudes das pessoas de valorizar o fato de fazer parte e de buscar que esta relação dê certo.
Que atitudes demonstram essa valorização? As atitudes de colaboração, de alinhamento com os objetivos coletivos, de busca da melhoria dos resultados (da equipe, da área, da empresa). São essas atitudes que influenciam a qualidade que se traduz em evitar erros, buscar soluções e minimizar os problemas existentes. A medida que torna tangível estes comportamentos é a quantidade de erros decorrentes de negligência, de falta de colaboração e de falta de assumir responsabilidade sobre os resultados . É uma medida que é positiva quando a ocorrência é zero. Qualquer quantidade de ocorrência é um sinal negativo. O grau menos desejado e mais grave, e que ocorre quando a insatisfação é muito alta nos fatores de confiança e pertencimento, é a fraude e a sabotagem. Ou seja, mais do que a atitude passiva de isentar-se de responsabilidade deixando passar a oportunidade de corrigir, de desculpar-se repassando e declarando que não lhe pertence é a atitude ativa de fazer com que o erro ou o problema ocorra.
Recentemente fizemos um projeto de análise desses fatores e desses indicadores conseqüentes em cerca de 600 lojas de uma cadeia de varejo com respostas de mais de 18000 profissionais e constatamos que os melhores índices de satisfação nesses fatores analisados tinham correlação alta com os indicadores de resultados. Sejam os resultados econômico-financeiros (produtividade), de rotatividade de profissionais e de perdas e quebras. Simplificando, as lojas com melhores resultados de negócio tinham melhores resultados em motivação (prazer e crescimento). As que tinham baixa rotatividade de profissionais tinham melhores resultados em compromisso (remuneração, prestígio e identidade). As que tinham índices baixos de perda por quebras tinham melhores índices em alinhamento (confiança e pertencimento). Os piores resultados, claro, estavam correlacionados aos menores índices de satisfação nos mesmos fatores.
Não há dúvida que há uma influência dos resultados de negócio na satisfação, assim como a melhoria da satisfação influencia os resultados. Alguns resultados do negócio ocorrem por condições favoráveis e ações estratégicas voltadas para mercado, imagem ou aspectos tecnológicos, outros são conseqüência direta da atuação dos recursos humanos da empresa. Fazer a gestão da satisfação e comprometimento dos profissionais e obter bons ou excelentes resultados significa maior possibilidade de melhores resultados do negócio. Resultados de comprometimento geram resultados de negócio.
Senir Fernandez é Formado em Letras pela FFCL-USP e em Comunicação pela ECA-USP. Pós Graduação em Comunicação (Semiologia) pela ECA-USP.